quarta-feira, 27 de julho de 2011

Pelos Caminhos das Vinhas

Se há passeio que valha a pena é percorrer o caminho entre o Lagido e o Cabrito na ilha do Pico. Com uma nota importante, é certo, há que percorrê-lo ao fim do dia, uns instantes antes do pôr do sol.

Na escolha dos meus percursos para a caminhada diária, fomos até Santa Luzia e aos seus caminhos da costa. Hoje todos melhorados e suas costas já com outros confortos mais de casas de veraneio do que adegas. Um parêntises chamamos costas aos pequenos aglomerados de adegas que se estendem ao longo da costa e que em tempo eram terras de transumância, ocupadas a penas durante o Verão para as vindimas.
De início percorremos o caminho entre o Lagido e a Furnezinha. Confesso que não gostei. É quase uma auto-estrada entre Santa Luzia e a Madalena, não permite a tranquilidade de um passeio. Passei então para o percurso alternativo entre o Lagido e o Cabrito... Não sei que vos diga, é  o caminho ideal para nos deixarmos vaguear num fim de tarde na ilha do Pico. A tranquilidade dos matos, do mar ali tão perto da outra ilha, São Jorge,  ao fundo enquadrando o horizonte.


Entre uns míseros carros que passam e o encontro com algumas pessoas nos Arcos e no Cabrito a caminhada é feita sobre uma tranquilidade perfeita de fim de tarde. Estende-se no negrume pachorrento das lages de lava, salpicadas de perrexil, cabreolas e bracel, nas muralha de pedra escura como uma noite sem estrelas, nas curraletas das vinhas, nas meia luas de pedra que abrigam as figueiras. E assim se deambula até chegar a outra costa, a outro aglomerado de pequenas adegas na sua maioría de pedra. Adegas com os seus alpenderes com mesas de  madeira compridas e bancos corridos e de onde nos salta o cheiro de jantares e almoços em família de peixe frito com batatas cozidas, caranguejos guisados ou de caldos de peixe cheirosos. Sonhamos em ter uma casa na costa, de fazer parte das tardes longas, dos cheiros intensos a mato a maresia e a vinho.


E vamos movendo um pé atrás do outro e contemplando, tornando cada passo uma espécie de ritual até nos depararmos com o local do culto por excelência, onde todos os deuses gostariam de ter casa. A singela e negra ermida do Cabrito. Não minto talvez se disser que é a mais bonita dos Açores, diria do mundo, mas ninguém me iria acreditar. Está ali no meio do nada afastada das casas, sozinha, contemplando o mar. Ali quase em cima da rocha com a sua porta verde de madeira, as suas pedras trabalhadas de estranhos símbolos e um pequeno campanário que nem sino tem. Não resisto e faço sempre o desvio, entrando pelo caminho de terra que me leva até ela, e demoro-me à sua frente olhando-a, sorrindo-lhe pela sua beleza simples que me enche a alma. E antes de partir benzo-me sempre...porque me é impossível não acreditar que esta ermida é divina que esta é a casa de um deus qualquer, ou de que ela mesmo é o próprio Deus. Depois sigo caminho até chegar à última costa antes de fazer o caminho de volta. O Cabrito. É a mais simples das costas de Santa Luzia, e  por isso mesmo a que gosto mais, aquela que para mim guarda melhor a sua autenticidade.


Depois volto e a volta é o fim do dia. Todos os dias repete-se o espectáculo e sem nunca me fartar, sentindo que todos os dias é a primeira vez, vejo o sol a ser engolido num horizonte infinito de mar e uns passos mais à frente o passeio acaba o dia acaba renovando a esperança de amanhã sempre mais um dia aqui.

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