quinta-feira, 9 de maio de 2019

Viagem onde o sol se põe - III


Hoje nas Flores foi dia das terras baixas. As nuvens cobrem o planalto central e, apesar de algum vento, ainda conseguimos uns pedaços de sol para nos acompanhar.
Se a Fajãzinha e o Mosteiro são cantinhos desta ilha onde, sem dúvida nenhuma, me imaginaria a viver, junto a esta lista a Costa do Lajedo.



Santa Cruz das Flores serviu-nos para mergulharmos na história da ilha. Visitámos o museu, no antigo Convento São Boaventura, recuperado recentemente. Um museu pequeno, que permite uma boa abordagem à ilha, revelando pormenores que de outra forma nos escapariam. Encontrei aqui a resposta à inesperada qualidade da manteiga florentina que compráramos. Pensei que tinha sido um golpe de sorte, mas no museu vim a descobrir que há muito as Flores está entre as primeiras ilhas dos Açores na produção de manteiga.


Após visita ao museu rumámos à costa nordeste, até à Ponta Ruiva, sendo aí surpreendidos por mais uma placa de museu. Concluimos que além das Flores ser a ilha da manteiga, é também a ilha dos museus. Seguindo as setas, demos conosco no pátio de uma casa, de onde nos surgiu o dono perguntando-nos se queríamos visitar o museu. Abriu-nos a porta de uma casinha de pedra fresca e repleta de pequenos tesouros. Deambulámos por entre as louças, ferramentas e peças de mobília, para terminarmos num delicioso copinho de licor caseiro de araçá.


Terminámos o dia na incrível na baía de Alagoa, onde colhi um belo ramo de agriões de água e uns inhames, para dar um toque florentino ao nosso jantar. Aqui voltámos encontrar o casal de espanhóis, companheiros de viagem do acaso, que acabámos por travar conhecimento por nos surpreendermos constantemente em cada esquina, sem nunca marcarmos encontro. Eles ficaram aqui, acampados, a ouvir garajaus e cagarros. Nós seguimos viagem para a Fazenda para  cozer os inhames e fazer a sopa de agrião :).

domingo, 5 de maio de 2019

Viagem onde se põe o sol - II


Por vezes os acasos do destino levam-nos aonde temos de ir. Assim começou o nosso segundo dia nas Flores. Quando nos apercebemos era dia 1 de Maio, tudo estava fechado e não tinhamos onde comprar comida para piquenicar pela ilha. Tivemos de pedir orientação e fomos conduzidos a uma pequena mercearia/café na Fajã Grande. Estando lá o destino mais óbvio para continuar a nossa exploração foi o Poço da Ribeira do Ferreiro.


Esta é uma lagoa alimentada pelas cascatas que descarregam incessantemente o exagero da água do topo da ilha.  É um lugar que se descobre ao fim de um caminho empedrado, subindo através da floresta de incensos, regada por inúmeros regatos que serpenteiam ecoando o seu suave escorrer das águas por entre pedras, musgos e fetos. Este é o caminho... aquele que se faz passo a passo, onde o fora conduz ao dentro, e onde tudo se vai revelando até ao momento final apoteótico, em que a escuridão do caminho se abre nas deslubrantes cascatas que caem das alturas, alimentando um lago cristalino por entre o verde e o azul.


Foi difícil sair daqui. Permanecemos uma boa parte da manhã deixando-nos fazer parte desta paisagem. Experienciei cada elemento movendo-me em posturas yoga, silenciando e deixando ser observada pela curiosidade dos tentilhões, melros, e toutinegras.


Continuámos inevitavelmente a viagem, seguindo para a bucólica Fajãzinha e os indecentes prados de cavalinha que nos deixam numa inveja mortal, porque na Terceira, a nossa horta anseia pelo chá desta milagrosa planta para se livrar do mau olhado dos fungos. 

E porque o dia estava maravilhoso e o topo nos chamava, atravessámo-lo de novo para rumarmos à ponta norte da ilha, a Ponta Delgada. Deambulámos nas planuras da Ponta do Albernaz, onde o grande farol marca a presença da ilha. 
Quando as luzes do fim do dia se aproximavam atravessámos o topo da ilha mais uma vez, e viemos terminar o dia no sol estampado nas rochas das falésias da Fajã Grande, desenhando arco-íris na neblina das cascatas.








sábado, 4 de maio de 2019

Viagem onde o sol se põe - I


Esta é uma viagem há muito prometida, e há muito adiada. Esta viagem chegou agora. Fizemos uma mala, e partimos em busca do sol para ocidente. O último pedaço de terra de Portugal, e da Europa. Aquelas duas migalhas perdidas nas lonjuras do Atlântico: O Corvo e as Flores.
Viemos para redescobrir, e descobrir juntos. Para experienciar cada recanto, decidi expressá-lo e partilha-lo através do Yoga AnahataGaia. Aqui fica o relato de 7 dias através das palavras e  posturas de Yoga que cada lugar me inspirou. Vamos a isto? ;)

Aterramos nas Flores num dia limpido, de céu azul e solarengo...olhamos o topo da ilha, e temendo a má fama das tempestades, nevoeiros e chuvas quisemos apenas guardar as malas no nosso ninho, a Barraka, situado na Fazenda das Lajes, e rumar ao topo.

Esperava-nos o sorridente Marco, francês radicado na ilha com a sua mulher Camile, que criaram este ninho onde nos recolhemos. Ao entrarmos foi evidente que era uma casa com alma, aqui cada recanto, cada peça de mobiliário foi feita por mãos de pessoas para receber pessoas. Senti-me logo em casa.

Já no planalto, apesar de já termos aqui estado há mais de 15 anos atrás, não conseguimos deixar de nos espantar novamente pela esponja gigante da qual o topo desta ilha se reveste. Como um gorro ou um colchão, as turfeiras cobrem tudo, num espesso manto ... Não há dúvida, quem manda aqui é a Água, este é o seu domínio. Este manto é esburacado aqui e acolá com as indecentes lagoas, e rasgado constantemente por ribeiras que tentam inutilmente vazar a água que se acumula.

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Passamos o que restava no dia na exploração de cada nova lagoa, sempre em busca de pássaros e claro, o Carlos na escuta constante dos "balidos" de narceja no céu. Eu tentava descubrir as plantas que muitos anos antes havia prospectado. Fui surpreendida pela imensa quantidade de folhados (Viburnum treleasei), que agora começavam a florir e com os bafo-de-boi (Ranunculus cortusifolius), duas espécies açorianicimas que estou certa contribuiram com a sua companheira cubres para dar o nome de Flores a esta ilha. Certo que hoje, talvez os visitates acreditem que o nome vem das hortênsias e conteiras que se espalham por todo o lado, e é certo que trazem colorido a estas paisagem dominadas de verdes, contudo competem ferozmente com a natureza pristina desta ilha.



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