terça-feira, 19 de março de 2013

Uma Ode ao meu pai




Se há coisa que não escolhemos é o pai que temos. É um tiro no escuro, seja o que deus quiser. Há quem tenha pais bons, maus, gordos, bonitos, inteligentes, etc ... Eu cá por mim só tenho um pai. Na palavra cabe tudo, não preciso de mais adjectivos.

É o meu paizarrão e ele, por si só, enche-me o coração todo.

Aprendi com ele a amar o campo
Aprendi a escolher
Aprendi a sonhar
Aprendi a ser desbocada
Aprendi que todos os dias nos pudemos reinventar e recomeçar
Aprendo com ele também a aceitar e a não ter medo do que está para além da fronteira invisível da vida.

O meu pai tem um espírito grande, mesmo que por vezes não saiba e se entristeça ao ver as limitações de uma vida de quase 80 anos. É uma fonte de inspiração inesgotável, surpreendendo-nos a cada nova etapa, aceitando, aprendendo e crescendo.

Antes de ainda ter consciência do mundo, já corria as terras do Pico, admirando a sua infindável beleza, atrás desse pai que me levava, sempre, ao sair da escola, para ir mudar as vacas.

Tornei-me uma sonhadora com ele.

Ele fez crescer o seu comércio, o hiper de Santo António. Não era propriamente um hiper, mas uma loja de freguesia, que como boa loja que era, vendia de tudo um pouco. Foi uma loja próspera e ele conseguiu transformá-la inúmeras vezes e, mesmo após grandes calamidades, reerguê-la, mais forte e com mais ideias.

Criou gado e foi agricultor, não tanto por gosto, mas porque tinha cinco filhos, e a cada um deles haveria de dar a possibilidade de um sonho. Ensinou-me que eu seria responsável pelo meu futuro e pelas minhas escolhas. Nunca me disse segue por ali. E, certamente pôs e põe, ainda, as mãos à cabeça, pelos caminhos que escolho, mas não me diz “eu bem te avisei”. Simplesmente fica ali ao meu lado, para quando eu escorregar me dar a mão novamente.

A reforma chegou, porque algum dia tinha de chegar. E deste pai, que se tinha dedicado exclusivamente ao comércio e à agricultura, esperávamos uma entrega a dias difíceis, de ócio, numa vida já sem objectivos.
Os homens grandes são assim: superam-se a a cada dia, perante o olhar atónito de quem os rodeia.

E vieram os projectos de agricultura em vasos, e veio o minhocário, os artigos de jornal, e o gosto pela cozinha.

Hoje, muitas vezes sentado na sua cadeira de rodas, vamos encontrá-lo na cozinha: picando, refogando, temperando um novo prato que será o seu jantar, quem sabe mesmo, uma refeição para a família inteira. Ou então, em frente ao computador, a escrever um dos seus artigos “Viver com saúde” para o jornal local, ou a publicar um “post” no Facebook.

O meu pai é sempre um homem de hoje, nunca é de ontem ou de amanhã, e é a sua eterna presença em tudo que faz que nos alimenta a nós filhos.

Protestamos com ele muitas vezes: com a forma como ainda vai mudar o mundo, e as suas soluções mirabolantes para os problemas do país; ou como consegue transformar a cozinha num “caos existencial”, de legumes espalhados pelos quatro cantos; ou pela cadeira de rodas motorizada que idealiza, de modo a deslocar-se às terras da Fajã para conceber um qualquer projecto hortícola. Não interessa verdadeiramente o disparate que lhe passa pela cabeça; o que interessa é que continua a sonhar e eu amo os seus sonhos. E amo-o também a ele, porque é um homem grande que não cabe no seu nome. E é, acima de tudo,

o meu PAI.

4 comentários:

  1. Que homenagem tão bonita! Ele leu-a? :)

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    1. Sim, ele leu. É muito bom pudermos prestar homenagem a pessoas que nos são importantes ainda quando estas as possam ler :)

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  2. Li a tua homenagem um dia ou dois depois de a teres publicado. Lindas e ricas de sentimento as tuas palavras. Tens portanto um pai todo contente. E sim concordo que estas coisas sejam ditas em vida. Só assim fazem sentido.
    Um abraço.

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  3. Só hoje li, que lindas palavras. Que lindo Pai!

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